
O que te dirá a mulher selvagem que existe em ti?
Há dias em que
sou mais loba do que mulher
e ainda estou a aprender a parar de me desculpar
pelo meu lado selvagem.
Nikita Gill
Qual destas duas faces é que tu mais mostras ao mundo?
Em cada mulher existem duas faces que expressam duas energias distintas e que, apesar de opostas, estabelecem uma relação simbiótica entre si. Quando ambos os aspectos são aceites, integrados, respeitados e devidamente cuidados, eles podem expressar-se no mais belo, poderoso e sagrado feminino.
De maneira alguma estas energias deverão ser subestimadas, e muito menos reprimidas, sob a ameaça de virem a ter um efeito destrutivo sobre nós, sobre os outros e sobre a linhagem de mulheres que nos irá preceder.
A estes dois lados ou arquétipos, que coexistem em todas nós, eu carinhosamente chamar-lhes-ei a Menina bonita e a Mulher selvagem.
Passo a explicar…
A Menina bonita
A menina bonita é o nosso lado naturalmente luminoso e encantador, através do qual se expressam as nossas características mais positivas como alegria, generosidade e bondade. É a energia que mais aceite é pela sociedade, pois não a desafia, não retalia, nem muito menos estremece as suas estruturas.
Contudo, este aspeto, tão repleto de luz e inocência, facilmente se pode tornar numa falsa aparência, numa máscara sorridente que esconde e reprime a nossa verdade, a nossa essência e, acima de tudo, o outro lado que também existe cá dentro – o sombrio ou, como lhe gosto de chamar, a Mulher Selvagem.
O lado luminoso deixa de brilhar no momento em que silenciamos as nossas crenças, os nossos valores, a nossa personalidade, os nossos sonhos, o nosso amor-próprio e auto-respeito, assim como as nossas emoções, inclusivamente as negativas.
De maneira a recebermos o amor, a aprovação e aceitação por parte dos demais, muitas vezes reprimimos a nossa verdadeira essência e o nosso lado selvagem, tornando-nos apenas em meninas bonitas, adoráveis e boazinhas.
Logo, e para que conste:
A menina bonita não rosna.
A menina bonita não chora.
A menina bonita não bate com a mão na mesa nem com o pé no chão.
A menina bonita diz sim, mesmo quando quer dizer não.
A menina bonita segue todo o protocolo, dito pela sociedade, sem questionar, duvidar e, muito menos, criticar.
A menina bonita não se rebela. Jamais.
A menina bonita é a face que a mulher procura mostrar ao mundo, pois sabe que, desta maneira, será aceite, amada e valorizada – inocentemente acha ela, note-se.
A Mulher Selvagem
A Mulher Selvagem é o nosso lado rebelde, indomável e livre; aquele que não se deixa prender pelas amarras dos outros, que luta por aquilo em que acredita e que, em momento algum, atraiçoa ou desrespeita a sua essência.
Ela é destemida, independente e feroz e isso é o que mais assusta e intimida os que por ela passam. Ela é incondicionalmente fiel a si mesma e à sua verdade e tudo fará para alcançar o seu propósito, mesmo que isso implique percorrer caminho sozinha.
Ela é selvagem, mas ela é fascinante.
A Mulher Selvagem espelha o nosso lado mais profundo, misterioso e sombrio. As suas raízes são extensas e a sabedoria que traz consigo é ancestral, passada em mãos por tantas outras gerações de Mulheres Selvagens.
No entanto, e apesar desta mulher trazer à luz o nosso lado mais obscuro, ela não é de maneira alguma negativa ou má. Nada disso. Ela é simplesmente uma das energias que habita em nós e que manifesta a nossa Natureza mais animal e instintiva. Ela é a mulher-loba que tudo fará para proteger as suas crias, mesmo que isso implique rosnar, morder e atacar.
Ela age com mestria e uma inabalável coragem, levando sempre no seu coração a compaixão, pois mesmo quando ela ataca, ela fá-lo com amor e com justiça. Contudo, esta Mulher Selvagem, linda e pura é uma espécie que se encontra em extinção.
A domesticação da Mulher Selvagem
De acordo com a cultura Tolteca, defendida pelos astecas, a percepção que temos da realidade é condicionada pelo que eles chamam de domesticação, que consiste em todas as influências externas que recebemos por parte do meio onde vivemos, nomeadamente de quem nos é mais próximo como a família, professores, amigos, colegas, companheiros e media.
Desde logo, e de maneira contínua, recebemos instruções sobre o que fazer e o que não fazer, o que ser e o que não ser. Somos ensinadas, ou domesticadas, a ser um modelo de mulher-cidadã que encaixe nas preferências de uma sociedade que valoriza e prioriza as Meninas bonitas.
O mundo domesticado não criou espaço para a Mulher Selvagem. Ela é demasiado livre, forte e independente. Ela é inteligente, sabe pensar e, pior, ela sabe agir sem medo ou hesitação. Este mundo conhece a força da Mulher Selvagem e, deste modo, prefere silenciá-la e afastá-la da tribo.
Este aspeto indomável que habita dentro de cada mulher é, na maioria das vezes, reprimido, principalmente, por nós mesmas. E, como acontece com todo o tipo de energia que não consegue fluir, ela acaba por se ir apagando, estagnando e criando bloqueios energéticos que, mais tarde, se manifestarão em desequilíbrios – do foro físico, mental e emocional.
O que a Mulher Selvagem que existe em ti tem para te dizer
A Mulher Selvagem habita dentro de ti; dentro de todas nós. Ela quer respirar, ela quer ver a luz do dia mas, mais do que tudo, ela deseja ser livre.
Esta energia original e primitiva encontra-se indissociavelmente conectada com a tua essência e com a tua sabedoria interior; é o teu lado mais profundo, precioso e sagrado. E, de uma coisa podes estar certa, no momento em que tu libertas a tua Mulher Selvagem, milagres acontecem; e acontecem porque tu entras em sintonia com as frequências vibratórias mais altas do Universo, aquelas que têm o poder de transformar o mal em bem, a escuridão em luz, o ódio em amor e o medo na mais poderosa das forças.
Para conseguires sentir a inigualável liberdade, força e amor pela qual vibra esta energia maravilhosa, antes de mais tu precisas conectar-te com ela; com a tua Mulher Selvagem. E, acredito que a maneira mais simples e eficaz de o fazer seja através da escrita.
Pega num papel e numa caneta e senta-te num lugar tranquilo. Se puderes, faz esta prática logo após despertares ou antes de adormeceres, uma vez que, nestes momentos, encontras-te num estado de consciência mais elevado.
A finalidade deste exercício é tu entrares em contacto com o arquétipo da Mulher Selvagem que existe dentro de ti e dialogares com ele. Eu sei que é algo estranho, mas sugiro que te entregues e confies no processo. Afinal de contas, nós só evoluímos quando nos abrimos ao desconhecido.
Responde então às seguintes questões, escrevendo de maneira livre e sem pausas:
Quem és tu (Mulher Selvagem)?
De que maneira te expressas na minha vida?
Sentes-te reprimida? Se sim, como te posso libertar?
Como me podes ajudar?
Que mensagem tens para mim?
O que preciso fazer para permanecer em contacto contigo?
A escrita-livre é uma das maneiras mais simples e incríveis de aceder à nossa sabedoria interior, aquela que tudo sabe e tudo conhece.
Espero que esta prática te ajude a aceder à tua Mulher selvagem e, principalmente, a soltar todas as amarras que a poderão estar a impedir de ser livre, hoje, amanhã e para sempre.
***
Dedico este artigo à Mulher Selvagem que existe em todas nós.
Eu curvo-me perante a sua grandiosidade.
Que seja para sempre um espírito livre e magnífico.
Em Amor e Luz.
F.
Lindooo
Uma prova de que a sociedade tenta domesticar a mulher selvagem é o facto de as raparigas serem mais inseguras do que os rapazes (regra geral), mesmo que sejam capazes e inteligentes. As raparigas têm melhores notas na escola, mas, ironicamente, mostram frequentemente mais insegurança. Os rapazes mostram mais segurança, mesmo que não sejam “tão bons”. Porquê? Ora, isto advém da educação que se dá às raparigas e das mensagens subliminares negativas que lhes são enviadas, através de comentários como “isso é coisa de rapazes”, “isso é uma área masculina” ou “isso é perigoso para uma mulher”. O mundo seria muito diferente se as raparigas e rapazes fossem MESMO educados da mesma maneira.